O mundo das dietas continua flutuando entre novos e velhos vilões. Agora que todos oficialmente odeiam açúcar, será que o negócio é encher o prato de manteiga, bacon e abacate?
Açúcar x Gordura
Quando o auge das dietas pregando baixo consumo de gordura apareceu no final dos anos 90, a população não ficou simplesmente mais magra e saudável, muito pelo contrário. Passados vinte anos, vivemos um grande aumento de obesidade, e aprendemos que o outro lado do rótulo “baixa gordura” deveria conter “provavelmente alto em açúcar, você vai engordar de qualquer jeito”.
Como nosso problema contra o consumo de açúcar continua cada vez maior, isso deixa as dietas baseadas em restrição de gordura em uma situação curiosa. Não mais o inimigo, as comidas gordurosas estão lentamente entrando em moda.
A tendência é especialmente proeminentes em círculos adotando a famosa dieta cetogênica. Na mídia social isso traduz em milhares de fotos de corpos atléticos, ovos cozidos, shakes de cores estranhas e caminhões de abacate servidos das formas mais variadas.
A idéia da dieta cetogênica é restringir os carboidratos de maneira tão drástica que seu corpo basicamente alimenta-se de suas gorduras, ou das gorduras que você come, como forma de energia. Esse processo é chamado de cetose.
Quando isso ocorre, seu corpo começa a produzir cetonas na sua circulação sanguínea. Todo mundo tem cetonas no sangue, mas durante a dieta cetogênica esses níveis são bem maiores.
Tratamento Médico
A dieta cetogênica é um tratamento médico usado normalmente em pacientes com crises de epilepsia severa, que não respondem a medicamentos. Quando o cérebro começa a usar as cetonas ao invés da glicose como forma de energia, a frequência das crises epilépticas tende a reduzir.
Nos últimos 10 anos muita pesquisa tem sido feita sobre o tema e hoje sabe-se de resultados positivos dessa dieta não apenas em pacientes com epilepsia severa, mas também como forma eficiente de controlar-se a diabetes tipo 2, e contra cânceres, quando aliado ao tratamento convencional.
Mais recentemente a cetose começou a ficar famosa fora do ambiente hospitalar e das universidades, como uma nova forma de auxiliar na perda de peso.
Pouco, mas pouco carboidrato mesmo
Para que seu corpo entre em cetose o nível de carboidratos consumidos tem que ser extremamente baixo, o que faz da dieta cetogênica uma dieta bastante restrita. A recomendação típica é a de se consumir entre 20 e 50 gramas de carboidratos por dia. Apenas para se ter uma idéia, dois ou três pedaços de fruta ou uma porção de arroz podem facilmente alcançar, ou ultrapassar sua meta de carboidratos para todo o dia!
Atingir o estado cetogênico também pode produzir sintomas temporários como dificuldade de raciocínio, fraqueza, cansaço, e o que alguns “praticantes” chamam de “gripe cetogénica”, cujos sintomas típicos são dores de cabeça, enjôos e prisão de ventre. Tudo isso faz com que manter esse tipo de dieta a longo prazo seja bastante difícil.
Como tratamento medicamentoso a dieta cetogênica é usada sob estrita supervisão médica. Se você estiver fazendo por conta própria pode ser difícil balancear seus micronutrientes de maneira correta porque comidas altas em proteína e gordura podem muitas vezes conter muito sódio ou poucas vitaminas.
Acrescente a isso o fato de que nem todas as gorduras são iguais. Nutricionistas aconselham que uma dieta saudável deve incluir gorduras monosaturadas e poliinsaturadas, que vem de alimentos como óleo de oliva, nozes, sementes, abacate e óleo de peixe.
“Esses alimentos não devem substituir outras comidas saudáveis como vegetais, frutas e grãos” diz a dietista Kacie Dickinson da Universidade de Flinders na Austrália. Se você estiver de fato buscando atingir um estado cetogênico não pode ser apenas uma questão de comer mais manteiga e bacon, como pregado na famosa Dieta Atkins”.
Variabilidade e qualidade são fundamentais. “O problema está em manter uma dieta alta em gordura que é cheia de alimentos processados”, explica o cientista e expert em nutrição Dr. Tim Crowe.
Para averiguar o que acontece ao corpo humano quando alimentado de más gorduras, o pesquisador Matt Cocks da Universidade John Moores de Liverpool conduziu um experimento com 10 homens e 10 mulheres, colocando-os em uma dieta de alta gordura por 7 dias. A ingestão diária de calorias dos participantes era ser composta de 60% de gorduras, e eles encheram a cara com salsichas, bacon, queijo e manteiga.
De tempo em tempo a maioria de nós come mais do que deveria em termos de comidas açucaradas e gordurosas. Essa nova pesquisa sugere porém que essa comilança afeta homens e mulheres de maneira diferente.
Todos nós sabemos que comer muita gordura pode causar problemas com nosso peso e a saúde do coração, porém um novo problema apenas agora descoberto é que comer muita gordura também afeta a maneira como nosso corpo processa outros tipos de comida, em particular carboidratos.
O objetivo do estudo de Cock era constatar se esse tipo de dieta mudaria a habilidade do corpo em lidar com alterações de açúcar no sangue - se o seu corpo não consegue lidar com picos de glicose, isso pode se tornar um fator de risco para diabete tipo 2. A pesquisa constatou, de maneira pouco surpreendente, que gorduras pouco saudáveis de fato contribuem para o problema, especialmente nos participantes do sexo masculino. O experimento foi feito em pequena escala, por isso deve-se ter cautela ao tirar-se conclusões precipitadas, mas isso é algo que deve ser levado em consideração.
“Foi um estudo interessante para observarmos os mecanismos de como esse processo funciona, e os participantes também comeram 50% mais de calorias do que estavam acostumados”, Crowe enfatiza. “Qualquer pessoa comendo essa quantidade extra de energia, mesmo que vindo de boas gorduras, irá começar a ganhar peso.”
“A gordura pode apresentar um papel em suprimir o apetite e consumo de calorias através dos seus efeitos em nosso sistema digestivo”, acrescenta Dickinson. “Nós precisamos entender isso melhor porque comer muita gordura também pode levar a um consumo exacerbado de calorias e contribuir para o aumento de peso.”
Uma dieta alta em gordura e baixa em carboidratos pode de fato contribuir para a perda de peso em algumas pessoas, mas mesmo com diversos fãs e pregadores desse tipo de alimentação, ela não constitui uma solução milagrosa e nem deve ser adotada por todos”, explica Crowe.
“Essa dieta não está de maneira nenhuma à frente de outras dietas que alguém pode escolher.”
Atenção: Qualquer informação dietética presente nesse artigo não consistem em nenhuma forma de aconselhamento médico e leitores devem consultar um especialista antes de tentarem quaisquer alterações extremas em seu estilo de vida.