A invisível perda da geração TripAdvisor

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A gente gosta de reclamar da globalização, gentrificação, de que o mundo está ficando cada vez mais igual, mais monótono, mas a gente também faz tudo igual! Existe muito prazer e aventura em sair por aí errando ruas, conhecendo pessoas novas, e experimentado comidas e locais “que a Internet não conhece”.

Ok, eu entendo, você só tem 2 semanas de preciosas férias, então quer aproveitar cada minuto e não pode se dar ao luxo de cometer um erro que possa prejudicar sua experiência. Tempo é dinheiro e cada minuto deve ser usado como se fosse o último.

Você planeja todos os detalhes com precisão, no Booking.com você encontra o ho(s)tel com as melhores reviews, no TripAdvisor as super dicas de onde comer, o que visitar e os 10 melhores lugares pra você tirar aquela selfie. Nada de errado com isso, quem gosta de viajar no escuro?!

Quando palavras não são suficientes...

Quando palavras não são suficientes...

Alexander Graham Bel - o "cara" do telefone - já advertia sobre "evitar o caminho já traçado porque ele conduz somente aonde os outros já foram", e todo mundo gosta de mencionar essa frase, mas será que isso também não vale pras suas viagens?

Ir pra Nova York e não tirar foto com a estátua da Liberdade ao fundo? Nem pensar! China? Porra, vamos pra Muralha! Em Londres, o Big Ben! Índia, Taj Mahal! E dá-lhe selfie! Iguais as da Maria, do Paulo, e do Pedro.... O mesmo vale pra comida. Pra que arriscar a bimboca suja da esquina, cheia de locais? Esqueça! Google, “melhores restaurantes perto de mim” e já era.

A gente gosta de reclamar da globalização, gentrificação, de que o mundo está ficando cada vez mais igual, mais monótono, mas a gente também faz tudo igual! As fotos ficam iguais, a comida é a mesma, os passeios caem nas mesmas ruas, sempre pelo caminho seguro, do "turista feliz". Quando você lê as críticas dos viajantes desses lugares, as fotos e comentários são similares, baseadas nas experiências dos outros. Morreu a originalidade, o senso de aventura, o acaso. Nos fechamos pro novo, pro diferente, pro “ruim”. Ninguém erra rua, descobre nada novo, ou faz novas sinapses porque a coisa está toda mastigada, ruminada na Internet, resolvida no GPS.

Trabalhei anos como garçom em Londres e me lembro das "piadas " que tínhamos para cada tipo de turista. Os americanos iam ser chatos e dar boas gorjetas, os chineses iam tirar de foto de tudo, os indianos iam fazer bagunça, e por aí vai… Quando eu e Vivi fomos perder a virgindade em um churrasco coreano, a primeira coisa que fizemos foi colocar o copo em cima de um suporte quadrado, que depois descobrimos, com o garçom se cagando de rir, era o prato! Seguido a isso enchemos o cara de perguntas do tipo "como comemos isso", ou "o que é aquilo"... Hoje nós somos os turistas "ignorantes" que um dia eu reclamei; Perguntando tudo, tirando foto de todas as comidas, levando horas pra se decidir. E são esses "erros" e cagadas - o sentar-se pra conversar com um estranho, as vezes por meio de gestos e desenhos, entrar na bimboca da tiazinha e comer as coisas mais esquisitas, ou, com sorte, o melhor prato da viagem - que abriram meus horizontes.

E agora... ?

E agora... ?

Quando a comida chinesa vira "só fritura", a indiana "apimentada" e a japonesa "só peixe cru", a gente vê a vida em poucos tons, como cachorro. A gente deixa de usar os outros sentidos que nos foram dados pela divina providência. A gente fica igual a média.

Todo mundo reclama de acampar. Que é ruim, tem mosquito, é muito frio, ou muito calor. Mas aí você passa uma semana em um super resort na praia, e em dez minutos resume a história toda. Aí quando você vai acampar um simples final de semana, dá tudo errado (ou certo) e você tem dias de coisas novas, engraçadas e horríveis pra dividir com os amigos. Já percebeu??

Quem está na chuva, é pra se molhar. Não é pra gostar, é pra experimentar. Se abrir para o novo, "o ruim", o feio, o diferente. Variety is the spice of life! E quem sabe, com sorte, em uma dessas investidas off-TripAdvisor, você não traça um novo caminho...