No topo da minha lista de coisas a fazer em Seul estava conhecer a famosa DMZ (Korean Demilitarized Zone). Pra quem não sabe, a DMZ é o nome dado para a faixa de terra que corre através da península da Coréia, e serve de espaço entre a República Popular Democrática da Coreia (Coréia do Norte) e a República da Coréia (Coréia do Sul).
A DMZ estabelecida ao final da Guerra da Coréia e divide a península coreana em duas partes, ela 250km de distância e cerca de 4km de largura.
É possível ir sozinho até a DMZ, de trem ou de carro (cerca de 40 minutos de Seul), mas convém muito arrumar um dos diversos tours oferecidos na cidade para que se possa saber um pouco mais da longa história do conflito entre as Coréias (que matou mais de 4 milhões de pessoas), além de simplificar acesso a alguns lugares mais críticos do local.
Para uma zona chamada de “desmilitarizada”, o lugar é impressionantemente militarizado 😋, pode-se sentir a tensão no ar. Literalmente. Quando chegamos, uma música tocava a todo vapor em poderosos alto-falantes e nos foi explicado que diariamente a Coréia do Sul toca canções pop em direção a Coréia do Norte, como forma de propaganda, e a Coréia do Norte, por sua vez, toca canções de homenagem ao imperador Kim, uma verdadeira guerra musical, imagine só? Guerra por que tecnicamente os países ainda estão em guerra, o que ocorre agora é um "armistício", mas vez ou outra a Coréia do Norte ainda manda um mísselzinho pro lado vizinho, só pra registrar presença.
Antes de chegarmos a guia deu as regras básicas do passeio, na maior parte dos lugares fotos e filmagens são proibidos, é essencial levar o passaporte e se ater aos tempos pré-determinados de estada em cada parada. Dependendo de onde se vá visitar, também deve-se seguir um código de vestimenta, sem shorts, tatuagens à mostra ou roupas informais (com rasgos ou furos). Mas não foi sempre assim. Alguns meses atrás militares da parte Norte e da parte Sul jogavam bola juntos e tinham uma relação amigável na fronteira. Foram as últimas ameaças nucleares do Imperador Kim e a eventual morte de um soldado que pos fim a diversão dos milicos. Eles foram proibidos de terem qualquer contato uns com os outros e os soldados norte coreanos começaram a sempre usar de óculos escuros, para evitar que eles se comuniquem ou façam contato por olhares.
Na Coréia do Sul o serviço militar é obrigatório e todo homem saudável é convocado para passar de 1 ano e 9 meses em treinamento, sem qualquer folga aos finais de semana, para visitar a família ou ver a namorada. Devido à grande tensão entre as Coréias, essas folgas foram banidas, em caso de emergência...
Por incrível que pareça, existem famílias sul coreanas que moram na DMZ! São aproximadamente 250 famílias que trabalham em sua maioria no cultivo de arroz, ginseng ou soja. Por ali não há escolas, supermercados, bares ou restaurantes, e eles precisam mostrar o passaporte toda vez que entram ou saem da área. Existe uma cortina de horário que os obriga estar de volta as 10 da noite, e se perderem a hora tem que esperar até as 6 da manhã do dia seguinte para voltar para casa... Imagine? Como benefício por encarar isso tudo eles não precisam pagar impostos. As restrições para morar ali também são muitas, não se pode simplesmente mudar pra DMZ. A solicitação pode ser aprovada ou não pelo governo, e é um processo bem complicado.
Como se não bastasse, muitas minas terrestres foram plantadas na área durante os anos 50 e evidências apontam que não muito tempo atrás - assustador, e ainda causam graves acidentes. A viagem pela estrada de acesso a zona desmilitarizada é toda cercada com arame farpado e lotada de plaquinhas vermelhas alertando sobre o perigo das minas. Para se ter uma idéia, 70% da força militar do Coréia do Sul está na fronteira.
A nossa última parada foi na estação de Pyeongyang, uma linha de trem que passa dentro da Coréia do Norte. O design foi feito em arquitetura de sobreposição, foi proposital pois se espera que um dia a Coréia do Norte e a do Sul possam se entender e o acesso a esta estação de trêm possa ser liberado novamente. Esta linha é super extensa e conecta a linha de trem de diversos países. Acredita-se que a tal linha poderia tecnicamente levar passageiros da Coréia do Sul até o UK (Reino Unido) em no máximo 2 semanas!
Entre outras histórias tristes sobre um povo que aparentemente não tem liberdade alguma, sofre de escassez de alimentos e pode ser preso ou morto caso tentem escapar das terras Coreanas do Norte, o Imperador Kim Jong-un segue engordando. Havia uma empresa dentro da DMZ que empregava funcionários Coreanos do Norte e do Sul. Não muito tempo atrás a empresa foi fechada. Do que se tem notícias é que a escassez de comida é tão grande sob o "regime Kim" que os Norte Coreanos guardavam o lanchinho oferecido a tarde e levavam para dividir com a família em casa a princípio. Com o tempo, passaram a contrabandear os bolinhos de chocolate para vender e criou-se um mercado negro de venda de bolos em terras Norte Coreanas, o esquema foi descoberto e as pessoas envolvidas punidas. Ao oposto de tudo que prega há teorias de que o Imperador Kim continua engordando e comendo muito bem e que é por vaidade. O objetivo seria parecer com seu avô, que foi um governante muito amado no passado, ou de que a sua paixão por queijo suíço (emmental) seja a culpada pelo ganho excessivo de peso da "única pessoa obesa" de todo o país.
Enquanto esperamos por um desfecho feliz para todos os envolvidos, os Coreanos seguem soltando farpas entre si. O K-pop (Korean popular music, como o Gangham style) segue alto nos poderosos auto-falantes, o mais próximo possível da fronteira com a Coréia do Norte, sempre visando ofender e irritar o inimigo com influência da cultura local e vice-versa. Enquanto a falta de gentileza por aqui for resolvida com um par de óculos escuros e músicas típicas, até que rola uma certa tranquilidade... mas difícil prever até quando...